Afeto

Leia esse texto ao som dessa música.

Não sei explicar ao certo o que aconteceu, mas eu pisquei e vim parar de moldura no batente da minha própria porta, esperando você subir as escadas e vestindo um sorriso irredutível no rosto, sem conseguir deixar de pensar como o mundo deu voltas e mesmo assim, nosso elo nunca se quebrou.

E, graças ao seu medo bobo de elevador, eu tenho um tempo extra pra respirar fundo e tentar fingir que não estou com o coração saindo pela boca de ansiedade ao te ver pela primeira vez, mas pela milésima vez.

Engraçado que dá pra quase tocar a calmaria de já te conhecer e o desespero coabitante de um caminhão desgovernado cheio de sentimento profundo vindo em minha direção.

Você mal desponta nos ladrilhos floridos do hall e meu corpo se coloca automaticamente na ponta dos pés, como numa dança milimetricamente ensaiada, aguardando seu encaixe de lego. Ninguém diz nada, porque não precisa ser dito.

E é nesse abraço, no segundo exato em que meu corpo deixa escapar simultaneamente um suspiro alto e uma lágrima tímida, que aquela ideia guardada no fundo do baú da mente com etiqueta vermelha escrito “É SÓ CARINHO, FAVOR NÃO MEXER” explode na minha cara num tom de deboche.

Então, eu me aninho ainda mais nesse abraço-casa e quase me odeio por um segundo, lembrando de quantas vezes tentei descrever em textos antigos a sensação do mundo parar por um minuto e nunca ter chego nem aos pés do que estou sentindo agora.

Juro que se você me perguntar quanto tempo durou o abraço, a resposta certa estará em algo entre uns 30 segundos ou uns 12 anos. Não deu pra medir em tempo.

Te solto quase pedindo desculpas por querer morar no seu peito, e, quando sinto seu olhar tão penetrante no meu, misturo as palavras e sorrio sem graça, olhando pra baixo. Você faz uma piada qualquer sobre eu não ter te convidado pra entrar ainda e segura minha mão, dizendo “oi”, como quem quer se re-conhecer do zero.

Finalmente, te puxo pra dentro (da minha casa e da minha vida) e fecho a porta pro resto do mundo. “Seja bem vindo (de novo)” – eu digo, te beijando a boca.

De hoje em diante, faremos história.

autor: Amanda Armelin

Bocuda, nerd, tatuada. Cervejeira de carteirinha e louca por cachorros (principalmente bulldogs). Além do sorriso no rosto, mantém paixão absoluta por bacon e sexo.

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