Itália: roteiro Assis (1 dia)

Quando decidimos ir pra Itália, minha mãe veio toda cheia de dedos me dizer que a única “exigência” dela na viagem todinha era conhecer Assis, com medo de que eu não gostasse da ideia. Mas o background aqui é muito maior do que parece e é óbvio que aceitei de primeira, sem pestanejar.

Explico porquê: para quem não sabe, tenho uma irmã mais nova, especial. Sua deficiência é rara e por não ter sido identificada durante a gravidez, resultou numa grande preocupação generalizada logo após seu parto prematuro, já que que ela nasceu lutando contra todas as estatísticas. Agora, responda-me: como lidar com uma notícia tão inesperada e desanimadora dessas? Como uma mãe descobre, no susto, que sua filha tão amada e esperada tem pouquíssimas chances de sobrevivência? É no mínimo, devastador.

Mas isso não impediu minha mãe de ter esperanças e de lutar pela Aline. Eu tinha apenas 4 anos e meio e não sei descrever nem de perto o que ela passou, mas sei que foi infernal. Sei que ela foi testada diariamente.  Mas eu também sei que ela não perdeu a fé nenhum minuto sequer (e não entremos aqui em religião, falo apenas de fé em seu significado mais puro, de acreditar, de desejar tanto a ponto de te manter caminhando em frente). Against all odds, e com todo amor e atenção dos profissionais do centrinho de bauru (Hospital de Reabilitação de Anomalias Crânio-Faciais), que são devotos fervorosos de São Francisco de Assis, protetor de crianças e animais, Aline sobreviveu.  Foi quando em sinal de agradecimento, mamãe fez uma promessa ao santo, jurando homenageá-lo sempre e quando possível, para que ela mesma nunca se esquecesse do milagre concedido à nossa loirinha.

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Hoje, Aline tem 24 anos, é formada no ensino médio comum, trabalha como assistente num laboratório de informática e além de muita independência, tem uma história de vida marcada por batalhas constantes e superações inspiradoras (inclusive conta câncer em estágio avançado). É meu maior exemplo e minha melhor inspiração em dias que a vida tenta me derrubar. Minha heroína favorita, meu amor mais incondicional.

Pois bem, voltando à promessa de mamãe, desde então ela coleciona imagens de São Francisco (já são mais de 200 unidades diferentes) e indo para a Itália, vimos a oportunidade única de agradecer em pessoa por tamanho presente em nossas vidas. Então, ainda com base em Florença, fomos para Assis de trem, com expectativas baixas por termos lido em sites de viagens por aí que a única e exclusiva coisa que havia para fazer por lá era visitar a tumba do santo.

Mas eles estavam muito errados.

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Chegamos na estação e ali mesmo compramos o bilhete de ônibus (ida e volta) para o percurso das igrejas (começa aí a primeira surpresa: são vários pontos a se visitar). Fomos até o topo (a cidade é bem inclinada) e resolvemos fazer a descida a pé. Acho que quero começar dizendo que me surpreendi com a vista: parecida com a Toscana e de construções simples e lindas, cheia de janelas floridas e pequenos becos com felizes surpresas, fizemos uma agradável caminhada entre lojas intermináveis de lembrancinhas enquanto, proporcionalmente, sentíamos cada vez mais paz em nossos corações.

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Particularmente, eu não tenho religião. Não sigo nenhuma doutrina e confesso ser agnóstica; mas sei o que senti ali e acredito no poder das energias boas. Depois, até lendo um pouco mais sobre, descobri que Assis é considerado um dos maiores vórtex de energia do planeta.

Tivemos uma tarde agradável, em sua maior parte em silêncio, apenas sentido toda a vibração e paz que cidadezinha tão linda e pequena era capaz de proporcionar. Comemos algo e então, chegamos à principal igreja onde pode-se visitar a tumba de São Francisco.

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Uma respirada funda e, logo ao entrar na igreja, eu e mamãe e desabamos em choro. Eu senti um arrepio inexplicável e me emocionei muito forte ao olhá-la e imediatamente entender o quanto estar ali era importante pra ela. Descemos as escadas até a tumba em silêncio, de braços dados, enquanto o silêncio ecoava amor e eu sentia o coração acelerar. Sentamos em frente do túmulo de são Francisco. Ali ficamos em silêncio. Perdemos a noção do tempo; tanto que não sei dizer se foram 5 ou 50 minutos ali. Sorrimos uma pra outra, levantamos ainda em silêncio e saímos. Confesso ter tirado uma foto proibida, só pelo significado do momento (era meu jeito de guardar aquele sentimento além de dentro de mim):

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E foi com essa sensação de paz que seguimos o dia, visitando ainda mais algumas lojinhas e então pegando o ônibus de volta até a estação ferroviária, para então voltarmos à Florença.

Da estação, ainda paramos comer nhoque de batata com molho de sálvia e massa caseira com ragu de javali, tomar um bom vinho da casa e só então voltamos para o hotel, para arrumarmos as malas (no dia seguinte a parada seria Roma), um bom e longo banho quente e uma feliz noite de sono.

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Termino esse post dizendo que Assis foi uma feliz surpresa e que, mesmo que você não tenha um histórico de fé, vale a visita. Todo mundo merece sentir essa paz.

PS: desnecessário dizer que a coleção de mamãe aumentou consideravelmente nesse dia, certo?

autor: Amanda Armelin

Bocuda, nerd, tatuada. Cervejeira de carteirinha e louca por cachorros (principalmente bulldogs). Além do sorriso no rosto, mantém paixão absoluta por bacon e sexo.

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